sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Jeepform para Iniciantes, por Lizzie Stark

por Lizzie Stark, em 17 de setembro de 2012
traduzido por Jonny Garcia (febboy@gmail.com) e revisado por Luiz Falcão (luizpires.mesmo@gmail.com)

Jogos jeepform possuem uma pegada misteriosa, talvez porque os jogos nórdicos em geral desafiem a pura taxonomia, e essa é a palavra mais definível que vai aparecer por aqui. Durante minhas viagens ouvi jogadores descreverem “jeepform” como qualquer tipo de jogo que tenha surgido nos países Nórdicos. Para jogadores indie, deixando de lado o neologismo funciona um pouco parecido como mencionar Belle & Sebastian quando eu estava na faculdade — isto identifica um hipster diante de outro; funciona como um código para as pessoas que estão representando (roleplay) seriamente, mesmo que eles não tenham certeza do que significa.

Muito bem, meus amados jogadores hipsters, eu estou aqui para explicar o que #$%! é jeepform para vocês... ao menos o que tenho captado durante minhas viagens.

Jeepform é um estilo de jogo freeform.


Que diabos é um jogo freeform? Está é uma ótima pergunta – pergunte a três Nórdicos e você terá cinco repostas. Mais ou menos, a cena freeform se desenvolveu a partir da cena dos jogos de mesa e agora está centralizada em torno da convenção Fastaval que ocorre na Dinamarca. Basicamente, pessoas se levantam e representam seus personagens durante um jogo de mesa e as coisas progrediram até que de repente as mesas já não existiam mais. Jogos freeform usam algumas técnicas de larp, como representar seu personagem, e algumas técnicas dos jogos de mesa, como avançar no tempo duas semanas para a dungeon.

Aqui está um gráfico útil:




Pense a respeito dessa maneira — em um larp platônico, há uma relação um-a-um entre realidade e o universo do jogo. Então seu eu lhe comprei uma caneca de cerveja nós iremos até uma taverna e eu lhe comparei uma caneca de cerveja. Se eu apunhalar seu personagem, eu irei representar falando “eu apunhalo seu personagem”. Jogos freeform usam algumas correspondências um-a-um — se eu gritar com você na vida real, eu estou gritando com você dentro do jogo — e algumas relações simbólicas — eu posso transformar minha caneta em uma espada se necessário.

Devido aos jogos freeform (e por extensão os jeepform) terem se desenvolvido a partir dos jogos de mesa, pessoas se referem a eles como jogos de mesa. Então jeepform não é larp, mesmo que você represente a cena fisicamente.

A maioria dos jogos são para 3 a 8 jogadores e podem ser executados em qualquer sala com privacidade e espaço suficientes. Cenários ou figurinos não são necessários.

Jeepform é o que a maioria dos (principalmente) dinamarqueses e suecos dizem que é.


Os jeepers decidem o que conta ou não como jogos jeepform. Jeepers iniciados desenvolvem jogos jeepform. Outras pessoas podem criar jogos no estilo jeepform, mas eles não estarão no site jeepen.org (com raras exceções e com os devidos comentários) e não são propriamente um jeepform. É como se eu fizesse um telefone com touch screen e mesmo assim não seria um iPhone, a menos que a Apple disse-se que sim. Ou como se eu projetasse uma bolsa e a carimbasse com logos da Lois Vuitton e mesmo assim não seria uma, a não ser que a companhia dissesse que é.

Certos temas são característicos dos jogos jeepform


A grande maioria dos jogos é ambientada no mundo real, mundano. Sem dragões aqui, apenas pessoas ordinárias tendo problemas ordinários com seus relacionamentos, trabalhos e suas vidas pessoais. Ligado a isso está a ideia de jogar close-to-home (perto de casa) — representa-se personagens com quem você tem algo em comum.

Jogar close-to-home (perto de casa) transforma a história em algo emocionalmente relevante para você, trazendo a vida real para dentro do jogo. Seu eu estiver jogando um jogo sobre relacionamentos e recriar a briga que tive com meu marido na semana passada, isto cria uma experiência de jogo muito diferente de representar um problema com um alien. Jogar close-to-home pode causar bleed, que é quando as emoções do jogador e do personagem se misturam. Nos EUA, nós frequentemente pensamos sobre bleed como algo que deve ser evitado, mas em muitos jogos Nórdicos isso é encorajado e gerenciado pelas formas do jogo. Jogar para provocar bleed gera uma visão sobre si mesmo e o mundo e cria emoções intensas que alguns jogadores buscam.

Uma vez que essas experiências de jogo estão mais relacionadas com as emoções (a historia interior), e menos relacionadas com o enredo (plot, a história exterior), suas histórias aparentes não tem muitos apelos. Por exemplo, o jogo pode ser sobre um grupo de apoio a maternidade que se torna cruel, ou um relacionamento onde pelo menos um dos parceiros experimente tentação e dúvida, ou ainda sobre um rapaz bêbado morrendo pelo alcoolismo. Não é incomum saber como a história termina antes do jogo começar, porque o ponto não é descobrir o que vai acontecer, mas, ao invés disso, explorar o tema e as emoções sugeridas pelo cenário. De forma semelhante, devido a muitos jogos jeepform — mas não todos — encorajarem o bleed, as fichas de personagem são mínimas ou inexistentes. Se tudo que eu sei sobre minha personagem é que ela é uma atriz, durante o jogo eu irei necessariamente preenchê-la com minhas experiências de vida, criando um personagem relevante para minha vida.

Uma vez que o bleed pode aparecer sorrateiramente para você, é importante lembrar que os jogadores tem algum controle sobre o quanto desejam jogar close-to-home — você pode escolher criar um personagem, uma máscara, entre você e o jogo, ou você pode tentar ser você mesmo na situação do jogo.

Jogos jeepform são altamente estruturados


Ao invés de deixar uma cena desdobrar-se continuamente, a maioria dos jogos jeepform são montados como um filme, com uma série de cenas. O Mestre (GM) atua como o diretor do filme, cortando cenas em pontos de tensão ao dizer “corta”, ajudando a montar a cena, controlando o tempo e introduzindo outros elementos para aumentar a tensão do jogo. Algumas vezes, o mestre pode solicitar que algumas cenas sejam representadas novamente — se a cena não está se arrastando ou não está conduzindo o drama, o mestre pode dizer “façam novamente, mas desta vez falem sobre a sua relação com a mãe dele”.

A maioria as cenas é focada em um pequeno grupo de personagens. Qualquer um que não esteja representando em uma cena particular, pode assistir o drama se desenrolar ou talvez entrar em cena como um NPC (personagem não jogador) para ajudar os personagens destacados a explorarem suas emoções.

Jogos jeepform usam metatécnicas


Metatécnicas quebram o fluxo da narrativa e enaltecem o drama. Há muitas metatécnicas diferentes; alguns jogos usam mais, outros menos. Segue algumas das técnicas mais comuns:

Monólogo. Durante a cena o mestre pode demandar um monólogo de um personagem apontando para ele e dizendo “monólogo”. O personagem desenvolve um solilóquio sobre o que se passa em sua cabeça. Quando o monólogo terminar a cena continua como se ninguém tivesse ouvido. Monólogos ajudam a dar corpo a personagens e transmitir informações importantes para os outros jogadores. Eu menciono a infertilidade do meu personagem durante um monólogo, e depois talvez um dos demais jogadores possa me pressionar abordar isto, mencionando filhos repetidamente.

Uma jeeper, Emily Care Boss, uma vez me disse, monólogos e outras metatécnicas frequentemente criam ironias dramáticas entre jogadores e personagens. Isto pode ser representado em prol das risadas — como por exemplo: dois personagens estão flertando e um deles realiza um monologo sobre como é repugnante o hálito do outro personagem — e também podem ser usados para complexidade/tragédia — por exemplo, quando um personagem oferece um monólogo sobre estar pensando em traição e então volta à cena de amores com sua esposa.

Passarinho na orelha (bird-in-ear). O mestre sussurra coisas no ouvido dos personagens para provocá-los, oferecendo sugestões diretas ou simulando pensamentos que talvez possam estar passando na mente dos personagens.

Telegrafar (telegraphing). Você pode trazer qualquer objeto que você precise para dentro do jogo com o poder da sua imaginação. O melhor jeito de fazer isto é em cena, por exemplo, dizendo “eu lhe trouxe flores” enquanto presenteia alguém com uma caneta. A frase telegrafa para os jogadores que a caneta agora representa um buque de flores. Também é possível — mas menos elegante — realizá-lo fora do jogo, dizendo “A caneta é uma faca” e usá-la apropriadamente.

Representação temporal (temporal play). Há provavelmente uma palavra mais oficialmente usada para isso, mas muitos jogos jeepform jogam com a representação do tempo. Os mestres podem acelerar a cena para duas cervejas depois. Em alguns jogos, é possível também representar flashbacks e cenas do futuro, muitas vezes usando diferentes espaços físicos na sala para ajudar todos acompanharem o presente.

Personagem não-monogamico (Character nonmonogamy). Muitas pessoas representam o mesmo personagem. Por exemplo, se dois personagens estão em cena e o mestre solicita um possível futuro, outros jogadores podem assumir os personagens. Outra possibilidade é representar múltiplos aspectos do mesmo personagem, como no jogo Doubt, onde dois jogadores representam atores relacionando-se, e outros dois jogadores representam os personagens na peça que eles estão apresentando.

De onde o nome jeepform veio?


Os jeepers apresentam muitas histórias apócrifas sobre a origem do termo. A melhor forma para saber a respeito é comprar uma cerveja para um jeeper.

Leitura complementar (em inglês):


Entrevista com o jeeper Frederik Berg Østergaard
Vi åker jeep! (inclui downloads gratuitos de jogos. Previous Occupants é uma boa opção para começar para mestres inciantes)
Nordic Larp Wiki sobre jeepform
Emily Care Boss e outros fazem perguntas a Tobias Wrigstad no fórum StoryGames.
Tobias Wrigstad sobre projetar jogos jeepform no fórum StoryGames.
Como aplicar um jogo jeepform no fórum StoryGames.

 ----- Lizzie Stark, é uma jornalista americana especializada em larp. É autora dos livros Leaving Mundania, que aborda o larp nos EUA e nos países Nórdicos, e Pocket Guide to American Freeform, que apresenta um formato de larp/rpg paricularmente americano; e também e dos larpscripts The Curse e In Residency.



quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Jeepform, por Emegent Play

Goshai Daian (Fronteiras de Akitan/ Breves Encarnações) legendou o vídeo curtinho do Emergent Play explicando mais ou menos o que é jeepform. Emergent Play é um canal do Youtube dedicado a apresentar e debater a teoria do RPG de mesa, por esse motivo ele começa dizendo que "não é bem verdade que o Jeepform é um tipo de larp"... mas esta discussão fica para outro dia. O canal tem publicações semanais e os vídeos tem duração de 1 a 5 minutos.

Além deste vídeo, Goshai anunciou ter planos para mais legendas em breve - ele está cozinhando um projeto que está chamando de TV LARP.


Problemas para ver o vídeo? Segue a transcrição na íntegra, em português:

Nós aqui na América do Norte não somos os únicos a explorar a criação de RPGs. Muitas ideias maravilhosas vieram dos países nórdicos. Uma em especial é o jeepform.

Episódio 38 - Jeepform

As pessoas costumam dizer que o Jeepform é uma forma de larp, mas isso não é bem verdade. Ele faz uma ponte entre o RPG de mesa e o larp, com ênfase no roleplay livre.

Jeepform
é mais um modo de jogar RPG do que uma concepção completamente nova de RPG. Ele tem algumas regras e princípios que são acordadas entre os participantes. Existem algumas características mais comuns nos jogos jeepform. Por exemplo: não é incomum que eles tenham um GM agindo como um diretor, estruturando cenas.

Eles costumam ter um alto índice de "bleed" em vários desses jogos um foco maior nos personagens e suas histórias, que frequentemente são mais próximas do cotidiano. Existe um jeepform sobre salvar reféns mas, até onde eu sei, não existe um jeepform sobre salvar o mundo.

E eles frequentemente usam "metatécnicas" como monológos, "telegraphing", usar um objeto X ao invés do objeto real e permitir que vários jogadores controlem o mesmo personagem. Mas, como isso funciona exatamente? Alguns jogos se definem como jeepform, mas são mais uma espécie de framework para criação de um cenário.

O jogo tende a focar na experiência emocional. O diretor irá estabelecer as cenas como objetivo de criar ações dramáticas tanto quanto uma narrativa envolvente. A cena também pode ser fragmentada durante o jogo para adicionar um momento mais interessante,  seja colocando mais informação ou adicionando sentido a alguma interação.

Isso tudo pode soar "sério" demais para jogos, mas esse jogos de fato são levados muito a sério às vezes nos países nórdicos. Teoria de RPG é uma coisa muito forte nessa parte do mundo e alguns países, como a Suécia, tem larps financiados com verbas públicas.

Mesmo aqueles que estão interessados em expandir os seus horizontes de jogo o larp nórdico talvez não seja algo para todo mundo e Jeepform pode ser até mais desafiador, mas a existência desse tipo de jogo não me surpreende. As pessoas querem experimentar coisas e o jeepform é uma tentativa de tornar essas experiências ainda mais significativas.

Links importantes abaixo e, como sempre, espero que o seu próximo jogo seja melhor do que o último!

Referências:
http://jeepen.org/
http://nplarp.blogspot.com.br/2... (versão em português)
http://www.gamingaswomen.com/posts/201...

sábado, 2 de agosto de 2014

[Fotos] Paulo Merlino no NpLarp Encontros

No sábado passado, dia 26 de julho, recebemos Paulo Merlino, do Grupo Batalha Cênica Salvador, mais uma vez em um NpLarp Encontros realizado na Biblioteca Pública Monteiro Lobato, no Centro de São Paulo.

Merlino falou um pouco sobre sua trajetória com o larp, as características que a prática adquire em sua cidade, Salvador, e mais especificamente em seu grupo a BCS. Dedicou parte de sua fala a explicação e defesa do modelo Larp de Campanha X Larp de Combate X Larp Artístico, relacionando-o a prática de swordplay, boffer e larp. Na rodada de perguntas, esclareceu mais detalhes sobre o funcionamento da Batalha Cênica Salvador, seu histórico e modelo de atividades - inclusive, sobre as características particulares que seu larp possui: a divisão temporal baseada em atos > cenas > campanhas > sagas; a existência de protagonistas, a criação e troca de personagens; o uso de técnicas como Ars Amandi e Ars Ordo; além de histórias e causos que fazem parte da memória do grupo e da memória do larp - e swordplay - soteropolitano.

Segundo encontro realizado com uma personalidade ligada ao larp de outro Estado do país, este Encontro deve ganhar uma versão em vídeo em breve, disponível aqui no blog do NpLarp. Antes disso, já recebemos o pesquisador Wagner Luiz Schimt em 2013, hoje envolvido em seu projeto de doutorado no Japão - cujos vídeos de documentação também devem estar aqui em breve.

O NpLarp Encontros também realizou o intercâmbio entre linguagens (o Teatro de Máscaras, os Workshops de Jane Eliot, os card/boardgames e o RPG Indie em 2011) e produtores de larp (Primeiro Encontro de Produtores, envolvendo produtores do Estado de São Paulo, em 2011; Segundo Encontro, envolvendo São Paulo e Minas Gerais, em 2013).

Abaixo, fotos do evento - do debate e também do larp realizado em seguida.


Depois da apresentação, rodada de perguntas e bate papo, Paulo Merlino realizou também, no espaço da gibiteca, o larp Ducados do grupo BCS, numa versão inédita.

O larp Ducados,em sua versão original - e não a modificação realizada durante o evento - pode ser encontrado no arquivo do Larp dos Reinos, disponibilizado pela Batalha Cênica Salvador em maio em seu grupo no facebook.